Na contra mão

Sempre, sempre na minha vida eu nadei contra a correnteza. Eu nunca tive condições e estudar em uma escola particular, e esse era meu grande sonho. Eu concluí o colegial em escola do estado. Em compensação, minha querida mãezinha, na verdade minha avó (DEP) pagou um curso de inglês para mim. Em três semestres consecutivos ganhei o diploma de melhor aluna de todas as escolas da cidade de São Paulo (naquela época as escola de inglês tinha um único dono, hoje elas são filiais). Bem, com isso acabei ganhando uma bolsa de estudos para continuar o curso. Mesmo com toda dificuldade para concluir, pois conforme os livros iam avançando, os alunos iam desistindo e as turmas se fechavam. Tive que mudar de Campus várias vezes até parar em Santana e concluir lá. Quando estava no último ano, um professor meu , no final da aula, me chamou e perguntou se eu tinha interesse em lecionar lá. Disse que sim, e ele me explicou o procedimento. Pagavam muito mal, mesmo assim eu topei, mas quando cheguei ao lugar onde seria entrevistada, obviamente depois de algumas provas, fiquei chocada, e pensei que jamais conseguiria uma vaga. Ali estavam pessoas bem mais velhas que eu, com experiência, viagens internacionais, cursos em Nova York e Londres... quase chorei naquela maldita salinha de espera, na verdade ali era uma "vanity fair", uma feira das vaidades... Não sabia que nada daquilo iria contar na hora da dinâmica. Todos aqueles que mais levantavam suas crinas eram os que mais envergonhados ficaram na dinâmica! Relutado saiu no dia seguinte: Eu tinha sido aprovada para o treinamento! Fiquei feliz, pois eu imaginava que a minha chance era zero, por não ter nada daquilo que meus colegas tinham...Comecei a trabalhar lá. Eu saí do nada para lecionar numa grande escola de inglês (pelo menos na época era assim). Eu ouvia pessoas dizendo que eu não iria longe, pois eu não poderia passar de uma recepcionista de alguma transportadora do Parque Novo Mundo. Imaginem só, essa aí, que não tem nada, que não tem educação! Não vai durar esse seu sonho!

Pois não é que vinguei e permaneci na escola por alguns anos, até que um dia, já formada em letras (pois é, também bolsista), tive uma proposta muito boa,de trabalhar em um laboratório de línguas com o público de letras em uma grande Universidade. Como sempre, não tenho nada a perder, fui. Novamente ouvi chiados de pessoas dizendo que aquele emprego era uma merda, ou que eu não tinha capacidade pois era muito nova entre outros maldizeres. Trabalhei lá até o dia que o laboratório fechou-se, em 2005. Entrei lá com apenas 20 anos, uma responsabilidade imensa encarar pessoas muito mais velhas que eu, alunas que me subjugavam por minha aparência juvenil. Pois bem, fiquei triste e desempregada, mas a mesma universidade abriu uma vaga para professor de Inglês Instrumental. E eu, mal sabia o que raios era esse tal de instrumental. Meu ex-chefe me indicou para o cargo. Fui até o diretor do curso que olhou meu currículo e disse que a vaga era minha. E só de pensar quantas e quantas pessoas haviam se submetido a testes para a tal vaga, eu entrei assim, de boa... muito provavelmente pelas boas palavras de meu ex-chefe.Novamente, eu, uma menina de 25 anos, com aparência de 18 (eram o que falavam de mim por lá), teve de enfrentar salas e salas cheias de alunos, cada sala com aproximadamente 80 pessoas. Lá estava a própria insegurança fingindo ser a pessoa mais segura do mundo (se assim não fizesse, perderia toda a minha "moral" com a sala, isso a gente aprende com alguns anos de magistério).

E hoje, divagando sobre a minha vida profissional, penso que eu jamais poderia ter chegado onde cheguei, jamais. Uma semi-analfabeta, saída de uma escola pública falida, eu, que comia macarrão naqueles pratinhos azuis e tomava leite com achocolatado também nas canequinhas azuis. Não! eu fiz tudo errado. Eu deveria ter permanecido na minha condição. Não devia ter quebrado essas barreiras que a natureza me impôs, deveria ter procurado um emprego numa transportadora... quem sabe hoje teria uns 3 filhos e um monte de roupa suja para lavar... quem sabe eu não teria tempo de ler filosofias baratas.

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